quarta-feira, 12 de março de 2008

20 - A moça na janela

Ela é a moça da janela, a moça que pita um cigarro na janela só pra ver o tempo passar.Depois do seu cafezinho, acende o seu cigarrinho e fica ali, com o olhar perdido entre os galhos das árvores frondosas e o prédio da matemática.
Entre uma tragada e outra, admira o entulho cair do telhado da FAU. Entre uma baforada e outra, admira os carros estacionados, estudantes passando lá embaixo, a poeira levantando, entrando através da janela e sujando toda a sua sala.
Como num quadro do Almeida Júnior, ela nos lembra como era bom ficar na janela pitando e jogando conversa fora.
Antigamente toda moça da janela queria arrumar um namorado, ver o movimento da rua ou ver a banda passar; se já tinha passado dos trinta, estava na janela para tomar conta da outra moça da janela que estava lá para arrumar um namorado ou ver um elefante do circo passar.
Mas a nossa Rita da Fita já deve ter namorado e continua namorando muito nessa vida e está na janela só para se entupir de nicotina e fumacinha e ver o lixo passar.
Sempre sorrindo, sempre simpática a Rita com seus lisos cabelos presos na fita, passa pela biblioteca com seu passo arroxadinho e rebolante dentro da calça jeans apertadinha, que faz chequi-chequi, em cima do seu salto plataforma, com seu decote ousado e provocante de causar inveja a qualquer garota de Ipanema. É a coisa mais linda que os alunos da FAU já viram passar.
A Rita da Fita também é do samba, não perde uma festa na faixa. Toda noite a cabrocha desabrocha tresloucada riscando todo salão, sua a blusinha justa, dá um show de arrepiar os cabelos das moças de Santana.
E no dia seguinte, ninguém diz que a Rita está trabalhando feito um zumbi de tanto sono da noite não dormida.
Mas um dia a Rita não veio trabalhar. A moça não apareceu na janela, as árvores ficaram tristes, o entulho não caiu, ninguém passou lá embaixo, o estacionamento ficou vazio. Tudo ficou parado à espera da moça do quadro do Almeida Júnior. Era domingo, ora pois!
Letícia 3/10/2002

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