quarta-feira, 12 de março de 2008

12 - Homenagem ao meu Rei.

Estou deveras triste, pois o meu rei, o meu muso, a minha fonte de inspiração, o Rodi se vai. Vai nos deixar e agora? quem vai encher o meu carrinho de livros, que quando estou prestes a esvaziá-lo, vem e diz:
- Ó, estes são compras.
- Estes têm produção científica.
- Estes estão pedindo com urgência.
- Este, não cabe no armário.....
E assim por diante, sempre com uma desculpa para encher o meu saco, ops, o carrinho. Mas às vezes o meu rei é um doce, me trás, junto com uns livrinhos, um bombom para adoçar a minha vida...
Mas só ás vezes!!!

Pois é, aquele baianinho que um dia largou o sol e a vida lenta de Salvador e veio de mala, cuia e papagaio, para tentar a sorte na apressada São Paulo, se deu bem, de tombador de livros virou um mestre filósofo ou será um filósofo mestre? Sei lá, pergunta pra ele.
Trabalhou por anos numa biblioteca obviamente cheia de mulheres, feito um paxá no seu harém, ainda que este harém não fosse lá essas coisas.

E foi nos primeiros dias de janeiro de 2006, ano do cachorro! que o Rodison chegou para a Emily e disse:
- Emily, ó, assim.. é que, então, eu fiz um concurso para professor...
- Que?! Peraí – arrumou a mesa, fechou todas as janelas do windows, desligou o celular, olhou para aquele ser pensante que a aguardava e disse: - Pode falar.
- Então, como eu estava falando, prestei um concurso ...
- Como? Concurso? De quê?
- Con-cur-so para ser pro-fes-sor no Es-ta-do...- falou meu rei, pau-sa-da-men-te tentando ser o mais suave possível com sua chefe, mas não adiantou muito.
- Mas então você vai nos deixar? Vai pedir demissão, peraí a gente pode ver com a Eliana, ou no DP, ou com o diretor, ou na Reitoria, para não perder o seu FGTS!

Com toda a paciência e a pressa baiana que Deus lhe deu, ele continua:
- É o que estou tentando lhe dizer...e...

Emily se agita, levanta da cadeira e solta um Ai Meu Deus! Não posso ficar sem você!
- Quem vai tombar? Quem vai destombar? Quem vai te substituir? Quem vai me agüentar? Quem vai controlar as compras? Quem vai preencher os pedidos? Quem vai atender o telefone? Quem? Quem? Quem vai?

E continuava agitada, anda pra lá e pra cá, toma um copo d´água, chama a Eliana:

- Eliana! O Rodison vai embora!
- Edla! o Rodison vai ser professor!
- O Rodison vai nos deixar!
- E agora Rodison? Como é que vai ser?

Estava para ter uma síncope cardíaca, um piti dos bons, então, ele suspira um suspiro profundo e diz:

- Diante de tantas perguntas as quais não sei se vou poder responder, assim, então, você Emily, tem que entender. As coisas mudam, a vida muda, as pessoas mudam e eu, não sei, é a vida. Um dia a gente está aqui, noutro ali, qualquer ser pensante é dialético e eu sou um ser pensante. Penso, logo existo e eu existo, sabe? estou aqui, Emily.... em carne e osso, ao vivo e a cores, sabe? assim, então, quero dizer, que todo este tempo que trabalhei aqui foi ótimo (frisando bem o óóó) as pessoas são ótimas, trabalhar com livros é ótimo, mas a minha vida está mudando, eu estou mudando, as coisas mudam. Veja bem, durante anos a minha aparência foi mudando, eu tinha cabelo, por exemplo, no meu interior agora sei nadar, mudei de casa e agora vou mudar de emprego. Então, assim. Ta.

Parou um pouco para respirar. A Edla só foi capaz de responder : É tudo muda....e continuou lendo o email da filha dos Estados Unidos, que mandou uma nova foto da Sofia.
A Emily continuava sem som. A Célia sem palavras, a Eliana bebendo água, a Vila atendendo ao telefone e a Regina sorriu e disse: É isso aí companheiro!

Meu rei olhou para o relógio:
- Então gente, vou tomar café.

E se foi deixando o seu pequeno harém boquiaberto com as suas profundas palavras.
E eu só fico aqui pensando, quem é que vai por ordem naquelas malditas doações.

Ah! Meu rei! Me deixe não.

Letícia 30/01/2006

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